REFLEXÕES SOBRE A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL


“PARA AS QUESTÕES DE ESTILO, NADE SEGUINDO A CORRENTEZA; NAS QUESTÕES DE PRINCÍPIO, SEJA SÓLIDO COMO UMA ROCHA”.
Thomas Jefferson


     A Constituição do Brasil de 1988, foi uma grande conquista em termos sociais, políticos e econômicos. Afinal após um longo período de ditadura militar a Nação brasileira ansiava por mudanças que pudessem contemplar todos os direitos fundamentais do cidadão e dessa maneira garantir igualdade na lei, para realidades individuais desiguais.
    Mas o simples fato da promulgação da Constituição não foi da noite para o dia que as mudanças aconteceram, para atender a todos os preceitos expressos na lei maior, foram e ainda são precisos inúmeras alterações legislativas, regulamentações, decretos e resoluções. Essas alterações ocorrem em todos os setores da sociedade, ou seja, da educação, saúde, meio ambiente, moradia e como não poderia deixar de ser na esfera administrativa.
     Nesse sentido é que nasce a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei Complementar nº. 101, de 04 de maio de 2000, que veio atender ao Capítulo II, Seção I, Art. 163 e sgts. da Constituição, que trata das Finanças Públicas. O artigo no caput, já deixava em aberto dizendo que Lei Complementar disporá sobre os aspectos referentes as finanças públicas.
     A Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei Complementar n º. 101, de 04 de maio de 2000, visa a regulamentar a Constituição Federal, na parte da Tributação e do Orçamento (Título VI), cujo Capítulo II estabelece as normas gerais de finanças públicas a serem observadas pelos três níveis de governo: Federal, Estadual e Municipal. A Lei de Responsabilidade Fiscal, venho atender à prescrição do artigo 163 da Constituição Federal de 1988, in verbis:

Art. Lei complementar disporá sobre:
I - finanças públicas;
II - dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo poder público;
III - concessão de garantias pelas entidades públicas;
IV - emissão e resgate de títulos da dívida pública;
V - fiscalização das instituições financeiras;
VI - operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VII - compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional.

     A LRF não substitui nem revoga a Lei nº. 4.320/64, que normatiza as finanças públicas no País há quase 40 anos. Embora a Constituição Federal tenha determinado a edição de uma nova lei complementar em substituição à Lei nº. 4.320. A LRF atende também ao artigo 169, que determina o estabelecimento de limites para as despesas com pessoal ativo e inativo da União a partir de Lei Complementar. Neste sentido, ela revoga a Lei Complementar n º 96, de 31 de maio de 1999, a chamada Lei Camata II (artigo 75 da LRF).
     A LRF atende ainda à prescrição do artigo 165 da Constituição, mais precisamente, o inciso II do parágrafo 9º.  Preceitua o dispositivo:

[...] Cabe à Lei Complementar estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta, bem como condições para a instituição e funcionamento de Fundos.

      E, por fim, a partir do seu artigo 68, a LRF vem atender à prescrição do artigo 250 da Constituição de 1988 que determina:
           
Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios concedidos pelo regime geral de previdência social, em adição aos recursos de sua arrecadação, a União poderá constituir fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei, que disporá sobre a natureza e administração desse fundo.

     A LRF, brasileira seguiu as ideias e experiências de outras Nações, com a anexação de princípios e normas, do direito pátrio. Entre os quais destaca-se os modelos do Fundo Monetário Internacional, organismo do qual o Brasil é Estado-membro, e que tem editado e difundido algumas normas de gestão pública em diversos países; entre eles a Nova Zelândia, em 1994, a Comunidade Econômica Europeia, a partir do Tratado de Maastricht e os Estados Unidos, onde as regras de disciplina e controle de gastos do governo central levaram à edição do Budget Enforcement Act, aliado ao princípio de “accountability”. Resumidamente a LRF abarcou as fundamentações:
           
a) FMI
 - Transparência dos atos: no setor público, as funções de política e de gestão devem ser bem
definidas e divulgadas ao público, informando sobre as atividades fiscais passadas, presentes
e programadas.
- Planejamento: a documentação orçamentária deve especificar objetivos da política fiscal,
estrutura macroeconômica, políticas orçamentárias e riscos fiscais.
 -Publicidade, prestação das contas, relatórios fiscais: as informações orçamentárias devem
facilitar sua análise;. as contas fiscais devem ser apresentadas periodicamente ao Legislativo e
ao público.
 b) CEE - Tratado de Maastricht
 - A definição de critérios para verificação da sustentação financeira da cada governo, como
em uma confederação.
- Estados membros conduzem suas políticas com relativa independência, convergindo para
critérios acordados; além disso, os estados membros devem evitar déficits excessivos.
- Comissão monitorará orçamento e estoque da dívida para identificar desvios: há metas e
punições.
- Pacto de estabilidade e crescimento de 1997 - cada estado membro é responsável por sua
política orçamentária, subordinadas às disposições do Tratado.
 c) Budget Enforcement Act – EUA
 - Contempla apenas o Governo Federal - cada unidade da federação tem suas regras.
- Congresso fixa metas de superávit e mecanismos de controle de gastos aplicações de regras adotadas pelo BEA.
- Sequestration - limitação de empenho para garantir limites e metas orçamentárias.
- Pay as you go - compensação orçamentária: qualquer ato que provoque aumento de despesas deve ser compensado através da redução em outras despesas ou aumento de receitas.
 d) Fiscal Responsibility Act – Nova Zelândia
 - Estado unitário e parlamentarista.
- Congresso fixa princípios e exige forte transparência do Executivo, que tem a liberdade para orçar e gastar.
- Princípios de gestão fiscal responsável: reduzir débito total da Coroa (dívida pública) a níveis prudentes.
- Alcançar e manter níveis de patrimônio líquido da Coroa que a protejam contra fatores imprevistos.
- Gerenciar prudentemente riscos fiscais da Coroa.
- O Fiscal Act difere dos programas anteriores porque não prevê metas fiscais; admite afastamentos temporários, desde que com previsão de meios para retorno; considera perigosa a perda de credibilidade pelo não cumprimento de metas; teme pela manipulação de informação para ajustá-las às metas fixadas.
 e) Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal de Estados

     O Programa teve início em 1995, com o Voto 162 do Conselho Monetário Nacional (CNM), sendo utilizado para o refinanciamento de dívidas estaduais, além da abertura de linhas de crédito para ações emergenciais, como o Programa de Demissão Voluntária (PDV), financiado com recursos da Caixa Econômica Federal.
     O Voto 162, do Conselho Monetário Nacional, proporcionou o refinanciamento de dívidas de Estados, a partir da assunção de compromissos fiscais com vistas ao equilíbrio orçamentário sustentável. Estas dívidas referiam-se a compromissos em atraso até 30 de novembro de 1995, acordados com o Ministério da Fazenda, (Linha de Crédito 1), financiamento de programas de ajuste do quadro de pessoal (Linha de Crédito II) e transformação de ARO´s (Antecipação de Receitas Orçamentárias) em dívida fundada (Linha da Crédito III).
     A possibilidade de obtenção dos benefícios do Voto 162 dependia de assunção de compromissos de ajuste fiscal e financeiro a serem mantidos pelos Estados durante a vigência do programa. Esses compromissos importavam em:
1. Controle e redução da despesa de pessoal, nos termos da Lei Complementar nº 82 de 1995
(a chamada Lei Camata I);
2. Privatização, concessão de serviços públicos, reforma patrimonial e controle de estatais
estaduais;
3. Aumento da receita, modernização e melhoria de sistemas de arrecadação, de controle do
gasto e de geração de informações fiscais, buscando explorar plenamente a base tributária e
desenvolver esforços para incrementar a arrecadação tributária própria;
4. Compromisso de resultado fiscal mínimo, traduzidos neste caso, em metas de resultado primário trimestral;
5. Redução e controle do endividamento estadual.

    O principal objetivo da Lei de Responsabilidade Fiscal, analisando o caput do art. 1º, consiste em estabelecer “normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal”.
    Assim, no parágrafo primeiro desse mesmo artigo procura-se definir o que se entende como “responsabilidade na gestão fiscal”, estabelecendo as seguintes premissas:

- ação planejada e transparente;
- prevenção de riscos e correção de desvios que afetem o equilíbrio das contas públicas;
- garantia de equilíbrio nas contas, via cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas, com limites e condições para a renúncia de receita e a geração de despesas com pessoal, seguridade, dívida, operações de crédito, concessão de garantia e inscrição em restos a pagar.

     Diversos pontos da LRF enfatizam a ação planejada e transparente na administração pública, a qual é a ação em planos previamente traçados e, no caso do serviço público, sujeitos à apreciação e aprovação da instância legislativa, garantindo-lhes a necessária legitimidade, característica do regime democrático de governo, que deve ser seguida em todas as esferas do Estado Brasileiro Democrático de Direito. Os instrumentos preconizados pela LRF para o planejamento do gasto público são os mesmos já adotados na Constituição Federal: o Plano Plurianual - PPA, a Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e a Lei Orçamentária Anual - LOA. O que a LRF busca, na verdade, é reforçar o papel da atividade de planejamento e, mais especificamente, a vinculação entre as atividades de planejamento e de execução do gasto público, esses instrumentos foram estudados durante às aulas de Direito Financeiro, com o Professor Valdemar.
     Acrescenta-se que a transparência será alcançada através do conhecimento e da participação da sociedade, assim como na ampla publicidade que deve cercar todos os atos e fatos ligados à arrecadação de receitas e à realização de despesas pelo poder público, que existe em função da própria existência concreta do Estado, que existe em decorrência dos indivíduos que o compõem e pagam tributos, que devem ser para atender aos “INTERESSES PÚBLICOS”, de todos e não de “alguns”. Para esse fim diversos mecanismos estão sendo instituídos pela LRF, dentre eles:


[...] a participação popular na discussão e elaboração dos planos e orçamentos já referidos (artigo 48, parágrafo único);
-  a disponibilidade das contas dos administradores, durante todo o exercício, para consulta e apreciação pelos cidadãos e instituições da sociedade (que devem estar disponíveis na Internet, como salientado nas aulas de Direito Financeiro);
- a emissão de relatórios periódicos de gestão fiscal e de execução orçamentária, igualmente de acesso público e ampla divulgação.

           
      A LRF, têm é uma tentativa de manter uma certa moralidade no controle das finanças públicas. Mas, por certo muito ainda acontece nos bastidores do Congresso Nacional, e todos os dias na mídia noticia-se nova corrupção no cenário da política brasileira. Diante da realidade que vislumbra-se no cotidiano pode-se dizer que apesar da LRF, e das Sanções previstas na Lei nº 10.028, que seria pena de 06 meses a 04 anos, o controle das finanças públicas ainda é deficitário.
     A Constituição de 1988, foi fundamental como garantidora dos direitos fundamentais e no também com objetivo de gestar as finanças públicas com transparência, planejamento, entre tantos objetivos. Para tal foram elaborados decretos, leis, resoluções que objetivam oferecer efetividade as disposições constitucionais. Entre elas a LRF, é um marco para que as gestões tenham em tese transparência.         A caminhada para que o Estado realmente ocupe-se com o aplicar os recursos em obras, programas e ações que objetivem o interesse público é longa, afinal a Nação brasileira em sua história é marcada por sucessivos momentos históricos alicerçados em corrupção, exploração, políticas públicas realizadas sem a devida responsabilidade social.
     Em relação a aplicabilidade das sanções previstas pela Lei 10.028, verifica-se que a punibilidade é pouca, frente a gravidade dos crimes cometidos, pois agir contra o interesse público, fraudar, sonegar, utilizar, traficar influências, enfim agir de maneira corrupta, é lesão que prejudica toda a sociedade, pois desviar, por exemplo dinheiro público, que iria para uma obra de educação é além de colocar a mão nos cofres do Estado, impedir que esse setor fundamental para o desenvolvimento da Nação brasileira possa ser melhorado, aperfeiçoado – basta analisar a atual situação do Brasil.

            Rosicler Fátima Tomaz Pereira Schäfer


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